Bolsonaro Tem que Negociar com o Congresso
Falta de articulação política é por incompetência e falta de compressão do papel institucional do presidente
Baseado nos meus parcos conhecimentos de ciências políticas e direito constitucional, afirmo que no parlamentarismo o 1o ministro é o chefe do governo e o presidente, no caso de não ser uma monarquia, é o chefe de Estado. No Brasil, como o regime é presidencialista, o ungido nas eleições gerais tem que assumir as duas funções.
Na recente viagem aos Estados Unidos, Bolsonaro apresentou um comportamento no mínimo errático para um chefe de Estado ao se comportar como um fã do presidente Trump, quase até a lhe pedir um autógrafo para mostrar aos filhos. Porém, o que mais nos aflige é a não compreensão do que é ser chefe de governo.
No parlamentarismo, o chefe de governo é um deputado e geralmente é o líder do maior partido que o apoia no Congresso. Novamente, não somos um pais parlamentarista, mas a constituição de 1988 deu bastante poder ao Congresso Nacional. Portanto, é necessário que o presidente tenha força no parlamento para aprovar os projetos de seu interesse.
Ao constantemente desmerecer as negociações com o parlamento e compará-las à corrupção, o presidente não só dificulta a aprovação de qualquer medida, como também corre o risco de abrir uma crise com o parlamento prejudicando sobremaneira o seu governo. Se demonizar a política ajudou a elegê-lo, com certeza, esse comportamento não vai ajudá-lo a governar. O poder no Brasil é compartilhado, e se o presidente não se dispuser a negociar com o parlamento, seu governo vai fracassar.
Várias são as maneiras do congresso conseguir inviabilizar o governo e não precisamos ficar apenas focado na reforma da previdência. Ao não conseguir aprovar o orçamento e nem mesmo as medidas provisórias, o executivo vai perdendo apoio e, em breve, o caos acaba se instaurando. Um exemplo prático: Se a reforma ministerial, que juntou vários ministérios através de uma medida provisória, não for votada nos próximos meses, vai caducar. Portanto, o Paulo Guedes pode deixar de ser super ministro mesmo antes da reforma ser votada.
A reforma da previdência é uma reforma assaz difícil de ser feita em qualquer lugar do mundo. Essa reforma é necessariamente impopular, pois não só todos têm que trabalhar mais, como também por retirar privilégios de setores muito bem organizados e corporativos. Não adianta uma equipe técnica ter apresentado uma proposta excelente, se o chefe do executivo não colocar o seu capital político para aprová-la. Cabe ao presidente organizar o seu time –esta é a sua responsabilidade no presidencialismo– e obter 3/5 dos votos dos parlamentares para as reformas constitucionais exigidas. Essa reforma não é uma panaceia que vai colocar imediatamente o Brasil de volta no pleno emprego se aprovada. Porém, dado o montante de recursos que já estão sendo gastos nas aposentadorias e a própria dinâmica dos gastos, se nada for feito, ou uma reforma muito diluída for aprovada, a crise fiscal voltará a assombrar o Brasil e Bolsonaro virará um ”pato manco” muito precocemente.
Nos mostra a história do Brasil, que os presidentes que não tinha apoio no Congresso caíram, com exceção óbvia dos períodos de ditadura. A própria Dilma começou a cavar o seu impeachment, quando desafiou o Eduardo Cunha, então candidato a presidente da Câmara. Não estou aqui querendo justificar qualquer acordo espúrio, não republicano, nem a nomeação de entrepostos no executivo para pilhar a máquina pública, como já vimos várias vezes no passado, mas não podemos nos iludir, que é possível governar sem articular com o Congresso.
Em nome da nova política não podemos abrir uma crise institucional, jogando o povo contra o parlamento. Acredito que a falta de articulação com o congresso seja mais por incompetência e falta de compressão do papel institucional do recém-eleito do que o parlamento querendo enganar o executivo e extrair de Bolsonaro recursos de uma maneira ilícita.
*Professor e Coordenador do Centro Macro-Brasil da FGV EESP